Ana Filipa Santos. A mestre que bate a esquerda a uma mão e idolatra o “toro” de Manacor

Sara Falcão/FPT

OEIRAS — Aos 25 anos, Ana Filipa Santos jogou pela primeira vez o quadro principal de singulares de um torneio de 60.000 dólares, no Oeiras Ladies Open. E se dentro do campo o resultado final não foi o desejado, fora dele a tenista de Santiago do Cacém foi protagonista de uma interessante conferência de imprensa na qual se deu a conhecer melhor e partilhou várias curiosidades sobre uma carreira que durante os últimos anos dividiu entre o ténis e os estudos.

“O meu intuito sempre foi seguir a carreira tenística a partir do terceiro ano do curso. Quando entrei na faculdade desisti um pouco do ténis, até tive uns convites para ir para os Estados Unidos, mas acabei por não ir porque nos meus anos de júnior tive várias lesões e até fiz uma cirurgia. Decidi ir para a faculdade e as pessoas da NOVA ‘chatearam-me’ bastante para entrar na equipa, mas eu disse que não queria nada com o ténis. Passados seis, sete meses comecei a ganhar outra vez o bichinho e um grande amigo, o Tiago Teixeira, colocou-me novamente no mundo do ténis. Nesse ano fui do qualifying aos quartos de final do Campeonato Nacional, onde perdi para a Maria João Koehler, e decidi começar a treinar um pouco mais. O curso ficou um pouco de lado porque o ténis passou a ser mais importante e as coisas más que tinha ficaram para trás, mas acho que ainda me assombram um bocadinho no campo”, recordou.

A sentir-se “como se tivesse outra vez 18 anos” e “a apostar a 100% no ténis pela primeira vez”, Ana Filipa Santos fala do ténis com uma alegria contagiante.

Mestre em Engenharia de Micro e Nanotecnologias — ciclo que concluiu “com uma apresentação às 9h da manhã depois de ter terminado um encontro com a Matilde Jorge, no Circuito Sénior, depois da meia-noite” — e jogadora da Fed Cup em 2019, cresceu com duas grandes referências, uma delas bem visível na indumentária com que se apresentou na conferência de imprensa: um boné com a marca de Rafael Nadal.

“É uma grande referência para mim. Desde pequenina que me revejo muito no Rafa, pela garra que ele tem, e na Justine Henin, porque tinha uma esquerda a uma mão e era pequenina como eu, mas corria bastante. Obviamente não posso deixar de falar também no Federer, que é um ídolo para todos. Este ano fui à Rafa Nadal Academy jogar um ITF de 15.000 dólares, foi o meu primeiro torneio do ano, e foi uma oportunidade única de perceber o contexto de uma academia de um jogador muito conhecido. Sempre que ele treinava eu parava tudo o que tinha a fazer. O Rafa é uma pessoa super humilde, que treina como se não houvesse amanhã e é um touro dentro do campo. Para mim é muito importante saber que existem pessoas simples no ténis e ele é super simples, humilde e trabalhador. Tudo o que dizem sobre ele dá para entender só com um treino, ou pelo facto de ele passar por nós e ser sempre educado.”

Curiosa por natureza, Ana Filipa Santos é uma das poucas jogadoras em Portugal com esquerda a uma mão, pancada pela qual optou com o primeiro treinador, Nuno Páscoa, porque “tinha zero jeito para bater a esquerda a duas mãos e depois de experimentarmos a uma mão vimos que saía de forma mais natural.”

Depois da esquerda, quis aprimorar o slice “porque tinha visto na televisão jogadoras a usarem o slice de esquerda”, que entretanto se tornou num dos seus maiores recursos para variar o jogo.

No Jamor, apesar da derrota, cumpriu “o sonho de jogar neste campo, porque desde muito nova que vi o Estoril Open aqui, a Maria [João Koehler] a jogar aqui, o Gastão e também o Gil” e retira experiências inesquecíveis do Oeiras Ladies Open: “Posso sempre levar coisas boas, como os treinos com raparigas com ranking muito elevado e tentar falar com elas para perceber de onde é que vêm e como é que começarem. No outro dia, por exemplo, treinei com a Dulgheru, que já foi número 26 do mundo, e estive a ver vídeos dela no Youtube. É um torneio muito importante para vermos onde é que ainda temos de trabalhar para chegar a este nível e acho que é uma boa experiência”, contou, apesar de reconhecer que “tenho de começar por jogar torneios mais baixos.”

Em relação à estreia em quadros principais de ITFs de 60.000 dólares, Ana Filipa Santos lamentou a derrota para a amiga Elizabet Hamaliy: “Entrei bastante bem no jogo, a ganhar por 4-1 e a jogar bastante bem. Estava a fazer as coisas certas e consegui ganhar um bom ascendente, mas depois senti que ela mudou um pouco a maneira de jogar e eu comecei a ficar presa, a sentir muito mais os nervos e os pensamentos [errados] vieram-me à cabeça. Foi por aí, porque depois a bola começou a ficar curta, ela entra muito bem [no court] e eu começo a correr, a fazer piscinas.”

“Ontem [domingo] estava bastante tranquila, mas hoje comecei a ficar nervosa quando comecei a aquecer e a falar do plano de jogo, mas tentei falar com o meu treinador sobre o aspeto mental e apesar dos nervos consegui entrar bem no jogo, mas depois a cabeça não deixou mais”, acrescentou, antes de falar do encaixe de estilos de jogo que, neste caso, lhe é desfavorável: “O meu jogo é muito à base de bolas altas na esquerda da adversária para ter a direita a três quartos e tenho uma boa esquerda e um bom slice, mas contra ela é difícil porque obviamente [daquele lado] tem a direita em vez da esquerda. E sempre senti que a minha direita cruzada não faria tanta mossa na esquerda dela, por isso foi difícil descobrir um plano de jogo para a defrontar, mas houve uma altura em que o fiz e comecei a ganhar mais jogos. Fico sempre muito nervosa quando a defronto, porque é um jogo em que sinto que tenho oportunidades e que posso ganhar, mas às vezes não consigo e foi isso que aconteceu hoje.”

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