‘Back the Brits’: O sonho do título escapou, mas em Glasgow a Grã-Bretanha recuperou a esperança

O silêncio (ainda) impera na Emirates Arena e no momento em que escrevo de uma sala de imprensa despida os últimos preparativos fazem-se em court para assegurar que tudo corre na perfeição no momento de coroação das próximas campeãs das Billie Jean King Cup Finals: Austrália ou Suíça. O troféu vive as últimas horas em solo britânico e num par de horas terá destino definido, mas algo tão ou mais valioso permanecerá em Glasgow – o sentimento de que ‘The Brits are Back’ e que a semana de festa esteve longe de ficar manchada pela eliminação nas meias-finais. Esse fator passa para segundo plano: a elite do ténis feminino regressou às Ilhas Britânicas e deixou o público em êxtase.

Por Daniel Baltazar Basto, em Glasgow

A candidatura britânica para suceder a Praga na lista de cidades anfitriãs do novo e revolucionário formato da Billie Jean King Cup (outrora denominada Fed Cup) suplantou as concorrentes, mas aquele que terá sido o motor basilar para tal eleição protagonizou um golpe de teatro e falhou o certame. De seu nome Emma Raducanu, que na temporada passada desenvolveu uma ascensão meteórica para se afirmar na elite enquanto teenager e que este domingo celebra o 20.º aniversário. A ausência da atual maior vedeta do ténis britânico ameaçava arruinar os planos da Lawn Tennis Association, mas uma perfeita fusão entre a grande determinação demonstrada em court e o caloroso apoio das bancadas provou que o ténis está bem vivo em terras de Carlos III.

A minha chegada a Glasgow coincidiu com uma pobre composição das bancadas nos primeiros embates da manhã de quinta-feira e a julgar pela fraca adesão do público podia julgar que a prova estava destinada ao malogro. Mas ainda era cedo para fazer observações e o que se seguiu da jornada inverteu por completo o sossego das primeiras horas. Tambores, trombetas, saxofones, pandeiretas (e até mesmo um avultado sousafone). A vibrante claque da casa não se ficou pelos cânticos de apoio e para as bancadas da Emirates Arena transportou uma autêntica orquestra.

A escassos metros de distância também quatro nomes do conjunto anfitrião se juntaram ao recital e passaram do sonho à realidade uma tarefa que se antevia quase impossível de concretizar. Primeiro Heather Watson e Harriet Dart nos singulares (tendo ficado a recente sensação de Wimbledon, Katie Boulter (124.ª), de fora por opção), logo de seguida Olivia Nicholls e Alicia Barnett nos pares: as heroínas britânicas selaram os 3-0 necessários frente à Espanha e elevaram a Grã-Bretanha às meias-finais pela primeira vez em 41 anos.

A equipa de ‘segunda linha’ de uma nação desfalcada da sua maior estrela provava que os favoritismos serviam para ser quebrados e foi com o estatuto de underdog que deslumbrou num grupo onde deixou para trás nomes como Elena Rybakina (22.ª) ou Paula Badosa (13.ª). Se o calor humano já se tinha assumido como prato principal no embate com nuestras hermanas, o que se reservava para este sábado extrapolava ainda mais o vibrante nível de delírio em todos os capítulos.

Com a Union Jack presente em ambas as bandeiras, a Grã-Bretanha recebia vinda do outro lado do mundo a Austrália que prometia lutar contra o sonho britânico. Storm Sanders adiantou-se e deu o primeiro tento para as dos antípodas, mas Dart ressuscitou a esperança ao igualar a contenda. O determinante embate de pares voltava a mostrar-se crucial e o fim de jejum de 41 anos longe da final esteve mais perto do que nunca de ser enterrado pela seleção visitada – mas os quatro pontos que separaram Nicholls e Barnett de repetirem a proeza de há dois dias atrás tornaram-se intransponíveis e o clima de celebração das australianas contrastou com amargura dos quase 4.000 espectadores que torciam para outro desfecho (3.927, para ser mais preciso).

A quarta vinda da prova máxima de seleções femininas a solo britânico não esteve longe de se traduzir na primeira presença da Grã-Bretanha em finais desde 1981, mas o sonho do primeiro título nas Billie Jean King Cup Finals fica adiado por mais um ano para o país inventor da modalidade. As capitaneadas por Anne Keothavong só podem sair de Glasgow de cabeça bem erguida e mesmo sem o troféu há algo que não lhes escapou: a certeza de que honraram as cores nacionais perante as maiores plateias da semana e a prova de que o clima de união prevaleceu à ausência da maior estrela. À Rússia suceder-se-á este domingo a Austrália ou a Suíça, mas é a Grã-Bretanha a campeã no plano de quem levou o deslumbramento e ilusão às bancadas.

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