Faro Open: 30 edições são sinónimo de uma longevidade sem igual em Portugal

A pandemia impediu a festa desejada, mas o Faro Open resistiu à situação atual e em 2021 celebra a 30.ª edição. É o torneio internacional há mais tempo em atividade em Portugal, sinónimo de uma longevidade sem igual e o resultado de um esforço pioneiro na região algarvia.

Por Gaspar Ribeiro Lança, em Faro

Tudo começou em 1992, com o Faro Ladies Open. Apaixonado pelo ténis e pela organização de eventos, o professor José Rosa Nunes espremeu a experiência ganha nos anos anteriores, como encordoador e “ajudante” dos torneios internacionais organizados no Sul do país pela Só Ténis, de João Lagos, e deu o passo decisivo para a transformação da capital do Algarve.

“A dada altura a Só Ténis deixou de vir para o Algarve, mas eu achei que era importante não perder a sequência que o João Lagos tinha começado cá. E então agarrei o primeiro Faro Ladies Open, em 1992. Sozinho, inexperiente, a experiência que tinha era a de os ter ajudado nas organizações dos outros eventos, mas este foi o primeiro torneio internacional a acontecer no Algarve organizado por um clube algarvio. Eram quatro campos e uma ‘barraquinha’ de madeira, tive de arranjar umas tendas e assim começámos”, contou ao Raquetc o fundador do Centro de Ténis e Padel de Faro.

José Rosa Nunes não começou no ténis, mas quando o descobriu apaixonou-se e nunca mais parou: “Quando acabei o curso em Educação Física, em Lisboa, comecei a dar aulas na escola. E como gostava de fazer várias coisas fui trabalhar para o Hotel Dom Pedro, onde o ténis começou a sério no Algarve. Eu era o ‘pau para todo o serviço’, dava aulas de ginástica, de natação, até que comecei a jogar ténis e me entusiasmei de tal maneira que passei a jogar os torneios sociais, aos sábados. Nos primeiros não ganhava a ninguém, mas depois fui ganhando uns jogos e o bichinho cresceu.”

Foi essa paixão que o levou a apostar, juntamente com dois sócios, nas instalações que entretanto se tornaram num espaço de referência não só no Algarve, mas também no país. “Entretanto fiz o curso de treinadores e comecei a dar aulas nos campos da Alameda, em Faro. Comecei com um aluno, depois dois, três e quando dei por mim tinha uma mão cheia deles. Dois deles eram donos desta urbanização e perguntaram-me se eu estava interessado em desenvolver o ténis nesta zona. Comecei com a ajuda deles, foram os meus dois sócios, e passados 10 anos comprei a parte deles e fiquei eu sozinho aqui no clube.”

E foi essa paixão que fez José Rosa Nunes insistir na realização de torneios internacionais em Faro mesmo nos “anos em que, por causa da crise, cheguei a fazer eventos destes sem qualquer patrocínio. Nunca quis deixar morrer a tradição, porque este é o torneio mais antigo em Faro e o maior evento desportivo depois da concentração de motas, que não é uma competição.

De volta a 1992, o primeiro Faro Ladies Open, com 10.000 dólares de prize-money, foi inesquecível: “As cabeças de cartaz eram a Sofia Prazeres, que chegou à final, a Joana Pedroso, a Tânia Couto e a Ana Catarina Nogueira, que vinha com os pais que eu fiquei a conhecer bem.”

A bancada instalada no court central do Centro de Ténis de Faro para a edição inaugural do Faro Ladies Open, em 1992

Para além da ligação às jogadoras e às famílias, Rosa Nunes também recorda com orgulho a importância do torneio para o desenvolvimento da arbitragem nacional: “Sinto que ajudei um bocadinho o ténis nacional, porque daqui saíram grandes árbitros internacionais. A Mariana Alves, o Rogério Santos, o António Flores Marques, entre outros. Naquela altura eles faziam poucos torneios internacionais, porque havia muito poucos, e o Faro Open foi a formação deles.”

E assim, ano após ano, o Faro Open continuou a evoluir. O torneio feminino realizou-se entre 1992 e 2002, totalizando 11 edições, e o masculino acontece ininterruptamente desde 1994. “Houve um ano em que fizemos dois torneios, daí que em 2021 estejamos a festejar as 30 edições em 29 anos.”

“Quando começámos o torneio masculino passaram por cá todos: o Emanuel Couto, o Bernardo Mota, o João Cunha e Silva e o Nuno Marques”, lembra Rosa Nunes, que anos mais tarde coroou pela primeira vez um campeão português em singulares.

Foi em 2005, quando Frederico Gil (então com 19 anos e número 635 mundial) derrotou o espanhol Marcel Granollers (390.º) por 6-2, 6-7(3) e 6-3 para conquistar o primeiro título da carreira no circuito internacional.

“Ter um português a ganhar a prova é uma alegria a dobrar: é a alegria de missão cumprida e a alegria de ver que o ténis português está bem, porque este nível é muito forte e ter um português a ganhar é bom sinal. E em termos de imagem do torneio fala-se mais, as pessoais locais aparecem mais para os encontros e toda a gente se apercebe melhor do que está a acontecer”, reconheceu José Rosa Nunes, que também é o presidente da Associação de Ténis do Algarve.

Três anos depois, o Faro Open voltou a coroar um campeão português — e não só: a vitória sorriu a Rui Machado, natural de Faro e jogador formado no Centro de Ténis de Faro, que na altura ocupava o 611.º posto do ranking e derrotou o francês Frederic Jeanclaude, por 6-2, 2-6 e 6-4.

“Ter um tenista algarvio e ainda por cima de Faro a ganhar é a cereja no topo do bolo. O Rui foi nosso atleta e não pode haver melhor. Esses são anos em que o clube também cresce muito, porque as pessoas vieram todas ver o Rui Machado jogar”, referiu, lembrando que também Pedro Sousa conquistou o torneio (em 2012).

Entre tantas edições, há momentos que não se esquecem: “Houve um ano em que organizei um circuito satélite e em 30 dias choveu em 22, ou seja, praticamente só jogámos em oito dias. Foi uma coisa horrível. Estávamos a jogar o Masters final no Hotel Alvor, chovia lá e eu vinha com os jogadores para Faro, depois começava a chover aqui e voltávamos para lá. Foi isto durante quase uma semana, até que a dois dias do Masters, já os jogadores tinham os bilhetes comprados, aconteceu uma coisa que não vi em mais lado nenhum: jogámos o Masters todo à chuva porque os jogadores pediram, disseram que precisavam dos pontos e do prize-money. Estou a lembrar-me da Marta André e do Paulo Dinis a arbitrarem enquanto chovia, os árbitros tinham uma sombrinha na cadeira e as bolas já mal saltavam. É uma coisa inconcebível nos dias de hoje, mas é a recordação mais caricata que tenho“, partilhou Rosa Nunes entre alguns sorrisos.

Com o passar dos anos, o Faro Open foi sofrendo alterações: em 2003 passou de Satélite a Future, em 2019 despediu-se do histórico qualifying com 128 jogadores — um luxo reservado a pouquíssimos ITFs — e em 2021 foi elevado pela primeira vez à categoria de 25.000 dólares. Uma “coincidência feliz com o 30.º aniversário do torneio” que se tornou possível graças aos apoios fundamentais da Câmara Municipal de Faro e da Federação Portuguesa de Ténis, entidades que José Rosa Nunes descreve como essenciais para o desenvolvimento e crescimento do torneio e também do Centro de Ténis e Padel de Faro, que em breve passará a ter campos cobertos “para funcionar verdadeiramente 365 dias por ano.”

Com um legado de 38 anos à frente do Centro de Ténis e Padel de Faro e de 29 anos em torneios internacionais, José Rosa Nunes assegura que “a tradição é para manter, até porque se não for eu serão os meus filhos [André e José Ricardo] que vão continuar.”

Vista aérea do Centro de Ténis e Padel de Faro (6 campos de ténis, 5 de padel, 1 de futebol e 1 de padbol)
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